Muricy Ramalho já recebeu o recado. Embora muitos conselheiros do São Paulo desejem sua volta, o presidente Carlos Augusto Barros e Silva não o quer. Ainda não o perdoa por tê-lo expulsado do vestiário, junto com amigos, em 2009. O treinador avisou que os jogadores precisavam de sossego.
O treinador está plenamente recuperado de sua diverticulite. Cumprindo a promessa feita a sua esposa, Roseli, Muricy tratou de fechar os ouvidos para propostas até o final desta temporada. Ele retirou a vesícula em abril. Está há seis meses descansando, se divertindo, relaxando com os filhos, Vai para programas de tevê, rádios, comenta jogos, dá palpite sobre a Seleção. Muito ético, defende Dunga até debaixo d’água.
Ele escuta muito o que seu amigo íntimo, e auxiliar, Tata diz. E ele falou que era hora de ‘fazer o que todos fizeram’. Ir para a Europa dar ‘uma reciclada’. E ‘tirar muitas fotos e ser filmado’. Era importante aprender novos conceitos e também mostrar que seu repertório será mais variado. Principalmente para a imprensa esportiva, que o cobrava muito nos últimos tempos de São Paulo. Seu ‘Muricybol’ não encantava mais. A insistências nos cruzamentos aéreos, a impaciência do seu time em prender bola no ataque. A inconsistência na recomposição. A postura passiva diante da falta de intensidade de jogadores como Ganso, Pato, Luís Fabiano.
Muricy aceitou. Mas quis ir logo no melhor time europeu. O campeão atual da Champions. O Barcelona. E por seu currículo de campeão da Libertadores, tetracampeão brasileiro, teve todas as portas abertas. Teve 12 dias para acompanhar o trabalho do time catalão.
Neymar intercedeu por ele junto a Luis Enrique e houve a liberação para que ele e Tata acompanhassem os treinos, fechados para a imprensa do mundo todo. Além disso, foi a jogos, conheceu como o Barcelona trabalha nas categorias de base. Quis saber também da administração. Enfim, uma reciclagem verdadeira.
Ele teve acesso ao que muitos técnicos brasileiros que passaram por lá não tiveram. Nem sonham. Não foi apenas uma rápida conversa com Luis Enrique e fotos. Ele mergulhou na intimidade, como se estivesse no Morumbi, no CCT da Barra Funda, em Cotia. Quis conhecer as instalações dos profissionais e dos garotos. Entendeu como eles fazem para estudar e jogar. Compreendeu que o Barcelona segue uma mesma filosofia em todas as suas categorias. Os times utilizam o mesmo esquema. Por isso fica mais fácil lançar garotos da base.
Muricy também teve uma aula de como tudo acontece fora do campo. Como o clube é firme com os atletas. Exige profissionalismo. Compreendeu porque Ronaldinho Gaúcho, no seu auge, foi negociado. Suas farras fora do campo estava contaminando o ambiente. Os catalães exigem respeito durante toda a temporada, inclusive nas folgas. Por isso, todo o excesso dos atletas nas férias é tolerado.
O treinador disse que escolheu o Barcelona porque a maneira de jogar, a escola, é a que mais se aproxima da brasileira. E teve contatos com os conceitos. A movimentação da equipe. A recomposição. A intensidade. A necessidade de o time atacar e defender em bloco. A qualidade da saída de bola. As triangulações pelas laterais. As infiltrações dos volantes. A inutilidade de um volante fixo na frente da zaga se seus laterais não atuam abertos como pontas. A troca constante de posição dos meio campistas e atacantes. Usar o conceito de preenchimento de espaço do basquete. Atacantes sem preguiça para marcar e cobrir laterais.
Neymar fez questão de ajudar a detalhar cada detalhe tático. Justo ele que detestava estratégia. Teve de aprender a movimentação não só dele, mas de todo o time. Assim como todos os atletas. Cada jogador precisa entender o que todos os outros fazem em campo.
Foi um choque para Muricy.
Os presidentes de clubes brasileiros trocam muitas informações. E Eduardo Bandeira de Mello já sabe que o São Paulo de Leco não terá Muricy em 2016. Não há a menor possibilidade. Os dois não se falam. Doriva também não vai ficar. Mas isso não interessa a Bandeira de Mello. Muricy, sim.
Esta reciclagem do treinador tetracampeão brasileiro e campeão da Libertadores chegou na melhor hora. Não só dentro do campo, assunto que Bandeira de Mello confirma não ser um profundo conhecedor.
Chegou até ele a maneira com que Muricy deseja fazer a integração entre o time profissional e a base. Usar o método que aprendeu no Barcelona. Fazer todos os times atuar da mesma maneira. Essa integração sempre ameaçou acontecer na Gávea, mas como em todos os clubes do país, a escolha dos técnicos da base serve como acomodação política. Indicações para agradar alas aliadas ao presidente.
Bandeira de Mello quer garantir, se for eleito, mais seriedade no elenco profissional. Não aceita mais espaço para festas regadas a mulheres, cerveja e colchonetes espalhados pelo chão, como a que custou o afastamento e multa de Alan Patrick, Everton, Marcelo Cirino, Pará e Paulinho.
O presidente flamenguista quer um novo técnico com muito mais energia e que não seja tão amigo dos atletas, como Oswaldo de Oliveira. Já é unanimidade a decisão de que ele não continuará no clube em 2016. Foi oportuno demais o contato de Muricy com a direção do clube catalão. E a exigência, por contrato, de um comportamento exemplar. Óbvio que os jogadores não agem como santos. Mas respeitam o clube até nos seus momentos de folga. Não se deixam fotografar com cerveja, prostitutas. Ainda mais com o time despencando no campeonato, acumulando cinco derrotas em seis partidas.
Muricy virou o nome mais comentado, mais forte na Gávea. E até mais barato. Ele está desempregado. O outro objeto de desejo, Cuca, tem contrato com o Shandong Luneng e recebe R$ 1,5 milhão. Por um terço desse dinheiro, o tetracampeão brasileiro pode aceitar trabalhar na Gávea.
O treinador sabe que não voltará ao São Paulo. E avisou que deseja trabalhar em clubes onde ainda não esteve. Quer algo novo na vida. O Flamengo quer uma nova filosofia.
O flerte já acontece.
Tem muita chance de virar casamento em 2016…
Fonte: Cosme Rímoli