sábado, 11 de fevereiro de 2017

Para Mauro Cezar, Flamengo deveria "esquecer" o Maracanã.



Vale a pena o Flamengo assumir o Maracanã? Seria entrar numa briga que envolve governo do Estado do Rio de Janeiro, Odebrecht, Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de 2016, donos de cadeiras cativas, antigos parceiros do voluntariamente extinto consórcio. Haveria o risco de perder domínio sobre o estádio ante recursos de populares, Ministério Público, organizações outras. Teria de ser respeitado o contrato firmado com o Fluminense, que tem direito a jogar lá por mais 32 anos sem despesas, etc.


Aparentemente não, realmente não vale a pena o Flamengo assumir aquilo. Primeiro porque não é o Maracanã. Como diz o jornalista Lúcio de Castro, o velho estádio concebido nos anos 1940 para a Copa do Mundo de 1950 contemplava todas as camadas da sociedade, nas quais os rubro-negros são sempre maioria. Do pobre geraldino aos arquibaldos, passando pelos que pagavam mais um pouco pelas cadeiras azuis, aos mais abastados das especiais ou camarotes. Essa coisa que está lá desde 2013 não tem nada disso.

O velho templo foi demolido impiedosamente sob a batuta de biltres que agiram como o Talebã ao detonar, no Afeganistão, estátuas de Buda datadas do século IX. O que ali surgiu é apenas uma asséptica arena padrão Fifa, com setores pensados em público de Copa do Mundo. Gente com dinheiro. A casa do Flamengo deve ser capaz de abrigar dos ricos aos pobres, mesmo que em alguns jogos especiais essa balança penda para determinado lado, pelas leis de oferta e procura que muitas vezes se impõem de maneira incontestável.

O New Maracanan não é casa do Flamengo, não pesa, não intimida. Fator campo é muito importante e ali ele não existe. Foi na volta para o espaço onde ficava o verdadeiro Maraca que o time perdeu a chance de lutar pelo título brasileiro de 2016, ganhando seis pontos em 12 disputados. Na temporada anterior, fora rivais cariocas, bateram os rubro-negros no palco da Copa 2014 Atlético Mineiro, Internacional, Corinthians e Figueirense! Algumas derrotas constrangedoras, como para corintianos e atleticanos, que pareciam em casa.

Para assumir o New Maracanan o Flamengo precisaria de condições excepcionais, com liberdade para arrancar cadeiras de trás dos gols e armar duas muralhas rubro-negras, usar apenas o anel inferior em jogos menores, etc. Mas esbarraria na (falta de) autorizações, da PM, concordância de parceiros… Sem o sinal verde para tais ações, jamais alguém conseguirá adaptar a arena Fifa a ponto de transformá-lo num estádio que tenha as características da maior torcida do Brasil. Sem contar seus elevados custos de manutenção.

O que fazer então? No curtíssimo prazo, jogar no estádio da Portuguesa, na Ilha do Governador, como o Atlético faz no Independência. E ir ao Maracanã em partidas de maior porte, avulsas, como o Galo faz com o Mineirão, seja lá quem for o futuro administrador daquilo. Negociação jogo a jogo. Quem será louco de assumir o New Maracanan e não querer o time mais popular da cidade jogando lá? Paralelamente, trabalhar na construção de um estádio próprio, mais barato e funcional, como existem na América do Sul e Europa.

Com € 80 milhões (cerca de R$ 267 milhões), o Espanyol abriu sua nova casa em 2009, o Cornellà-El Prat, em Barcelona, para 40,5 mil torcedores. No mesmo ano, na Alemanha surgiu a Augsburg Arena, onde cabem 30.660 pessoas por € 45 milhões (R$ 150 milhões). De 2011, o Juventus Stadium comporta 41.254 tifosi e custou € 122 milhões (R$ 407 milhões). No ano passado o Peñarol abriu as portas de sua nova cancha para 40 mil carboneros, o Campeón del Siglo, após mais de dois anos em obras. Custou US$ 40 milhões (R$ 125 milhões).

Com R$ 300 a R$ 400 milhões, sem superfaturamento, é possível erguer uma ótima casa para 45 mil a 50 mil rubro-negros em algum ponto do Rio de Janeiro. Imaginemos que 10 mil desses lugares sejam cadeiras vendidas por R$ 10 mil cada uma, pagas em 20 parcelas de R$ 500. Isso já geraria R$ 100 milhões. Outros setores poderiam ser comercializados, por cifras maiores ou menores. De acordo com a procura, o projeto seria adaptado em meio à obra, com mais, ou menos, assentos em setores de maior ou menor procura.

Se um shopping center é projetado de maneira que um andar de estacionamento vira área de lojas e outra garagem é construída em cima, por que o estádio não pode ser bolado de forma que, aumentando a procura por camarotes ou cadeiras VIPS, alterações ocorram nos primeiros anos? Um ajuste à demanda? Será tão difícil? Ao mesmo tempo, a cancha rubro-negra teria setores realmente populares. Seria pensada de forma que as organizadas, que puxam o grito, sejam estrategicamente posicionadas.

Misto de negócio e paixão, palco de jogos que gere receita e resultados, com tamanho compatível com a procura real, factível, hoje. Se em 2016 o Liverpool ampliou seu velho Anfield, que é de 1884, dos 45.276 para 54.074 torcedores, o que impede um novo estádio projetado para, digamos, 45 mil, se necessário ter sua capacidade ampliada para 50 mil, 60 mil? Nesse cenário, valem a pena os esforços, o dinheiro despejado, o desgaste, o custo que a adoção do New Maracanan pode causar? Aparentemente não.

Fonte: Mauro César Pereira

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