Suas decisões são frias, rápidas, práticas.
Rodolfo Landim não perde tempo com discussões, reuniões.
E, muitas vezes, cruéis.
Levou para a Gávea sua experiência de comando do mundo corporativo.
Tem como parceiro, escudo e incentivador, o diretor de relações internacionais, Luiz Eduardo Baptista, o 'Bap'.
A meta de Landim é colocar, para nunca mais sair, o Flamengo em outro patamar.
Financeiro, estrutural e competitivo.
Encontrou o ambiente do futebol amador, acomodado, complacente, diante da competitividade canibal que vivia, nas empresas que trabalhou.
Quem convive com ele o qualifica como extremamente autoritário.
Não se importa com a opinião pública.
Faz o que acredita ser o certo.
"Aprender a não ter medo de apanhar, como eu aprendi, impede você de ser covarde."
“Não existe situação na vida em que eu vá me acovardar."
"Se passar a mão na minha bunda, vai tomar uma porrada."
"Seja do tamanho que for", resumiu ao grande jornalista e companheiro de décadas do Estadão, o jornalista Luiz Maklouf Carvalho, falecido na semana passada, no perfil publicado na revista Piauí.
Trata o clube como se fosse uma empresa.
Precisa lucrar, crescer, expandir a qualquer custo.
Engenheiro, 63 anos, trabalhou 26 anos na Petrobrás.
Saiu da estatal para comandar as MMX, OGX e OSX, três empresas de Eike Batista, a quem processava. Pedia R$ 270 milhões. Perdeu.
Mas quem o conhece garante que ele aprimorou a 'arte' de tomar decisões impopulares, mas firmes, com o desafeto Eike.
Mesmo não sendo próximos, o empresário, que já foi um dos homens mais ricos do mundo o influenciou. Como fez com todos que trabalharam com ele.
E tendo um principal mantra.
Sempre tendo o lucro como meta.
Landim não vendeu sua petroleira Ouro Preto, que tinha há dez anos, à toa.
Ele queria, e está se dedicando inteiramente, ao Flamengo.
Foi com essa formação rígida, autoritária e capitalista selvagem, que lida com as situações envolvendo o clube mais popular do Brasil.
Aproveitou a situação financeira deixada por Bandeira de Mello e partiu para o ponto onde o ex-presidente falhou. Montou um grande time e conseguiu o melhor treinador do país.
Ganhou Carioca, Brasileiro e Libertadores, vice Mundial.
Fez de 2019, um ano excepcional, em todos os sentidos, dentro do campo.
Fora dele, tomou decisões que beiraram a insensibilidade.
A começar pelo terrível incêndio no dormitório improvisado na concentração, na madrugada do dia 8 de fevereiro de 2019.
Dez garotos morreram. Queimados ou sufocados pela fumaça. O dormitório parecia uma ratoeira. Contêineres emendados, com uma só saída.
Uma tragédia.
Landim foi calculista com as famílias desesperadas, que perderam seus filhos, netos. A pessoas que poderiam mudar sua realidade financeira.
O Ministério Público do Trabalho e a Defensoria Pública do Rio de Janeiro se juntaram para ajudar os familiares a conseguirem uma indenização coletiva pelas mortes.
Landim mandou que o clube entrasse em uma batalha jurídica. Não aceitou pagar as indenizações que ficariam entre R$ 24 e 30 milhões. Mesmo com o clube se encaminhando e, realmente, faturou R$ 900 milhões em 2019.
A batalha jurídica continua.
E Landim não se importando com as críticas.
Ele considera que não há jurisprudência de indenizações de mortos em incêndios no Brasil.
A terrível tragédia da boate Kiss, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, com 262 mortos, serve como triste referência.
Apesar de tudo ter acontecido em 2013, as famílias ainda buscam as indenizações.
Landim agiu também de forma autoritária em relação à premiação da final do Mundial.
Antes da partida contra o Liverpool, o elenco estava empolgado, unido.
E os jogadores decidiram abrir mão de 30% da premiação que teriam direito pelo Brasileiro e Libertadores.
Era um desejo de meses.
Landim, Bap e o CEO Reinaldo Belotti ficaram revoltados. Acreditaram que seria dinheiro demais para os funcionários.
Seriam R$ 33 milhões pela Libertadores e R$ 28 milhões pelo Brasileiro. A Conmebol pagou R$ 86 milhões pelo título da América do Sul. E a CBF, R$ 33 milhões pelo título nacional.
A direção resolveu diminuir drasticamente o que seria pago aos funcionários, como os jogadores queriam. Mal chegou a um terço.
A reunião decisiva aconteceu na véspera do jogo contra o Liverpool, situação absurda, esportivamente.
A postura desagradou os atletas, mas eles seguem sem comentar publicamente o conflito.
Landim começou 2020 desafiando a Globo. Não aceitou os R$ 13 milhões pela transmissão do Carioca. Eram R$ 100 milhões ou nada. E o Flamengo ganhou a Taça Guanabara e ninguém assistiu. A situação seguia no mesmo rumo, até que veio a pandemia.
A meta da direção flamenguista era faturar em 2020 mais de R$ 1 bilhão. Talvez chegar a R$ 1,2 bilhão.
Foi essa mentalidade calculista que fez com que mandasse embora 62 funcionários do Flamengo, por conta dos prejuízos com a pandemia.
Só que o coronavírus tirou do balanço três meses. E pode chegar a quatro, cinco. Ninguém sabe.
Para evitar mais prejuízo, Landim fez com que o médico Márcio Tannure fizesse um protocolo de segurança que garantisse a volta do time aos treinos.
Nesse meio tempo, o Flamengo sofreu a morte do massagista Jorginho, que trabalhava há 40 anos na Gávea. Era adorado pelos jogadores. Faleceu de coronavírus.
Testes foram feitos em 293 pessoas entre atletas, comissão técnica, funcionários e familiares. Foram 38 resultados positivos. Entre eles, três jogadores do time.
O elenco ficou apavorado.
Landim não se importou.
Ele seguiu brigando pela volta do futebol. Tendo o presidente do Vasco, Alexandre Campello, e o presidente da Federação Carioca, Rubens Lopes, como parceiros, o presidente do Flamengo seguiu sua campanha pelo retorno da competição.
Não se importando com o país viver seu pior momento na pandemia. Com maior número de mortos.
Fluminense e Botafogo se colocaram contra publicamente e travaram o movimento.
Landim recebeu o apoio de Jair Bolsonaro. E foi para Brasília, acompanhado com Campello, almoçar com o presidente.
Discutiram a possibilidade de treinos, e até jogos, em Brasília.
Os dirigentes saíram com a promessa que o governo fará tudo para apressar a liberação do futebol.
Foi quando Landim decidiu fazer mais.
E mesmo em uma nova bateria de testes no Flamengo mostrando outro jogador infectado, ele decidiu que os atletas treinariam no Ninho do Urubu.
Mesmo com o prefeito Marcelo Crivella proibindo.
Foi assim na terça-feira.
A informação vazou e a TV Globo colocou um drone no Ninho do Urubu. E o time foi flagrado treinando, novamente.
Crivella reforçou que os treinos estão proibidos.
Landim segue firme, com a equipe trabalhando.
O Vasco e nenhum outro clube carioca está treinando.
"O Flamengo já enterrou um massagista, tem jogadores e profissionais contaminados."
"E não entendo isso de jogar em Brasília, pois é uma falta de respeito aos jogadores. Tirar eles das famílias em momento de tensão e recordes de mortes."
"Tirar das famílias e deixar os jogadores em hotel trancados?"
"Fora da realidade."
"Não sei bem o que quer o Flamengo."
"Será que o Campeonato Carioca será contra Gama, Brasiliense? Ou jogará somente com o Vasco ou se querem jogar sozinho."
"Será que estão pensando em Libertadores com países com problemas sérios?"
"O Flamengo pode treinar onde quiser. Sair do Ninho e ir para Brasília..."
"Tomara que não tenham de treinar no [cemitério] São Joao Batista, Caju ou Jardim da Saudade."
A pesada ironia foi do ex-presidente e membro do Comitê Gestor do Botafogo, Carlos Augusto Montenegro.
Landim segue firme.
Quer os treinamentos.
Acredita que, se o Flamengo treinar, pressionará o futebol brasileiro a voltar.
E não vai ceder.
Mesmo com o medo dos atletas.
Com as críticas.
Ameaças da prefeitura.
Ele quer a volta do lucro na Gávea.
E trata a situação como uma guerra particular.
Foi assim que aprendeu a trabalhar, competir.
A viver.
Esse é o perfil de Luiz Rodolfo Landim Machado...
Fonte: R7 - Cosme Rimoli