Depois de 157 dias, Paolo Guerrero acabou com seu jejum. Foi o maior da carreira, desde que se tornou jogador profissional, em 2002, no time B do Bayern de Munique. O máximo que havia ficado foram 98 dias no Corinthians, em 2014. E foi um tormento, na época.
O maior ídolo do futebol peruano atual se acostumou com elogios. Com o apelido de El Depredador da mídia de seu país. “Ficar sem marcar é o meu maior castigo”, desabafou no Parque São Jorge. Mano Menezes teve muito trabalho psicológico com o atacante.
Mas na Gávea, tudo foi muito pior. Contratado a peso de ouro. São R$ 650 mil por três anos e mais R$ 16 milhões em luvas. O dinheiro envolvido chega a R$ 39,4 milhões. Situação complicada para qualquer clube brasileiro. Ainda mais o Flamengo que devia mais de R$ 500 milhões quando foi contratado.
Guerrero foi uma necessidade para o grupo de Bandeira de Mello garantir a reeleição. Ele precisava de um ídolo. E aproveitou a resistência corintiana em pagar tão alto pelo jogador.
Ele encontrou combinação terrível. Equipe fraca, pressão enorme e uma entorse no tornozelo direito. A contusão trouxe problemas inesperados. O jogador revelou ter sido obrigado a se submeter à infiltração de analgésicos e anti-inflamatórios para entrar em campo.
“Para deixar bem claro, o Guerrero não tem nenhuma lesão. O que ele sentiu foi uma dor no tornozelo. Nem é no mesmo local, é próximo. Uma coisa absolutamente normal num atleta de futebol. Todos eles sentem algo em algum momento. E a gente optou por fazer uma infiltração, procedimento que injeta anti-inflamatório local, exatamente porque era algo pequeno. Ele ainda sente um pouco de insegurança, o que é uma coisa absolutamente normal dentro da reabilitação de uma lesão”, desabafou o médico Marcio Tannure.
Guerrero já havia reclamado para os dirigentes da falta de estrutura da Gávea. Principalmente de aparelhos que ajudassem na recuperação após os jogos. As queixas chegaram à imprensa. O ambiente foi ficando ruim, tenso.
Ao assumir, Muricy Ramalho foi avisado do problema. E teve uma longa conversa com o peruano. Falou o quanto confia e precisa dele nesta reestruturação do Flamengo. Chegou até a prometer que o Centro de Treinamento seria modernizado. Não se importava com jejum algum e que se fosse preciso, enfrentaria os jornalistas por ele. Aliás, estaria liberado para dar entrevistas quando quisesse. Se não quisesse falar, sem problemas.
Sheik se tornou o escudeiro do peruano. Jogador vivido, comunicativo, tratou de amenizar o cenário. Aproximar os companheiros do artilheiro.
Guerrero treinou até nas férias. Sabia que seria muito cobrado este ano. Como já foi nos amistosos diante do Ceará e Santa Cruz. Quando perdeu até pênaltis na decisão do troféu Chico Science.
O jogador seguiu calado para o Mineirão. Para a estreia da Primeira Liga.
Mais de 30 mil torcedores foram empolgados ao estádio. Acreditavam na vitória atleticana, o time de Aguirre havia conquistado o Florida Cup. Dava demonstrações de estar melhor preparado neste início de temporada.
Só que o Flamengo se superou. O time de Muricy marcou muito bem. Usou duas linhas atrás da bola. Preencheu a entrada de sua área como se jogasse handebol, não futebol. E explorou os contragolpes.
E em dois deles, Cirino e Sheik, de peito, deixaram Guerrero livre. Os arremates de fora da área foram indefensável para o ótimo Victor. 2 a 0, Flamengo. Fim de jejum. Final feliz?
Nem tanto.
Quando os empresários Bruno Paiva, Marcelo Goldfarb e Marcelo Robalinho negociaram a ida do jogador para o Flamengo fizeram uma exigência. Que a multa de 18 milhões de euros, cerca de R$ 79,5 milhões, durasse apenas até junho de 2016.
A partir de julho deste ano, quando a janela para a Europa for reaberta, seu custo baixará muito. Para apenas seis milhões de euros, cerca de R$ 26,6 milhões. Era pegar ou largar.
A cúpula flamenguista fez as contas. Se algum clube europeu decidir levar o jogador, ele terá recebido 12 salários de R$ 650 mil. O que totaliza R$ 7,8 milhões. Mais 12 parcelas de R$ 445 mil, referentes às luvas. R$ 5,3 milhões. Ou seja, R$ 13,1 milhões.
O Flamengo desfrutaria de um midiático ídolo por um ano. E ainda teria um reforço nos cofres de R$ 13,5 milhões se fosse vendido.
A diretoria carioca não toca no assunto. Mas não nega que teve de aceitar a redução em 68% pelo seu principal jogador a partir de julho.
622 Fim de jejum de 157 dias traz confiança a Guerrero. Mas apreensão ao Flamengo. Sua multa diminuirá 68% em julho. Será um artilheiro barato para clubes europeus. E, principalmente, ao mercado chinês...
Guerrero tem 32 anos. Suas chances de realizar seu sonho dourado, voltar para um grande clube europeu, são mínimas. Só que existe outros mercados.
A maior ameaça é o chinês. O Shandong Luneng, comandado por Mano Menezes, já sondou o peruano no final do ano passado. Mas seus representantes teriam pedido um salário de R$ 3 milhões. Como o jogador vivia o jejum, houve a desistência.
O Al Ain dos Emirados Árabes também tentou levar o atacante. A pedida também foi altíssima, para não fechar o negócio. Perto de R$ 2 milhões mensais.
As transações não foram fechadas.
Mas os emissários dos dois clubes já sabem.
A multa terá uma desvalorização de 68% em julho.
O dinheiro economizado, que seria gasto com o Flamengo, poderia ser dado em salários para o atacante. Sem que os dirigentes cariocas pudessem fazer nada.
Bandeira de Mello sabia muito bem dessa possibilidade.
Mas seu objetivo principal era ganhar a eleição.
Isso ele conseguiu.
A contratação de Guerrero contribuiu.
Agora resta esperar o que ele fará até julho.
O jejum já acabou.
De forma empolgante, emocionante, no Mineirão.
A confiança está recuperada.
Os gols devem voltar.
Só que a alegria daqui seis meses pode virar despedida.
Tudo dentro do previsto.
Foi o preço para Paolo Guerrero vestir a camisa do Flamengo…
Fonte: Cosme Rímoli
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