Foi rico em reflexões o bom clássico que terminou no 1 a 1 entre Flamengo e Corinthians, em Itaquera, jogo que embora tenha mostrado um Flamengo com ótimos momentos no segundo tempo, não reduziu a diferença de 12 pontos para o líder do campeonato.
Uma destas reflexões diz respeito à maior das controvérsias que cerca o ano rubro-negro: a alucinante pressão sobre o técnico Zé Ricardo.
Embora seja necessário levar em conta as dificuldades de um calendário que reduz a quantidade de treinos, as mudanças de elenco com o ano andamento, é pertinente discutir se este Flamengo poderia ter evoluído mais no ano. É natural, em especial por ter um elenco acima da média nacional e uma base que ficou de 2016. Mas é recorrente ouvir que Zé Ricardo “não está à altura do tamanho do Flamengo”. Se a frase se referir ao repertório, ao desempenho do time, até cabe a polêmica. Mas o jogo de Itaquera ofereceu a prova definitiva de que o entendimento do DNA, da identidade ofensiva que tradicionalmente se cobra do Flamengo, este não lhe falta. Algo que exige ousadia num país em que a grande maioria dos times especula.
Imaginemos um técnico jovem, superexposto à pressão num país que demite sem parar, diante de 45 mil torcedores rivais no estádio do time que, de longe, lidera o Brasileiro. Que outra situação pareceria mais propícia a fazer recuar um treinador com tal perfil? Zé Ricardo não abriu mão da busca pelo protagonismo, uma de suas convicções. E este foi o maior mérito do Flamengo que, mesmo em Itaquera, transformou a partida num confronto de ideias. De um lado, um time ultraconservador, eficiente numa ideia de jogo predominante num país que vem consagrando como virtude máxima o chamado “saber sofrer”, como se fosse utópico esperar que o líder do campeonato sofresse menos em diversos jogos. De outro lado, um rubro-negro que tentou ter a bola e ter iniciativa.
O início de jogo parecia animador para o Flamengo, que mantinha a bola no campo contrário e chegara a ter uma chance. Até que surgiu o erro grosseiro da arbitragem ao invalidar o gol de Jô. O lance, todo ele legal, não teve efeito no placar, mas teve efeito moral. O Flamengo se desnorteou: manteve o domínio da bola, mas sem qualquer profundidade ou penetração. E aí surge outra reflexão.
Ao tentar jogar no campo contrário, o Flamengo tem falhado em dois pontos cruciais: falta de pressão após a perda da bola na frente e desajuste na última linha defensiva. O segundo ataque do Corinthians resultou no segundo gol de Jô, o primeiro válido. Balbuena lançou o atacante às costas de uma defesa sem tanta velocidade. O Corinthians era melhor até ali e impunaha ao Flamengo um gol num tipo de lance recorrente, que já vitimara o rubro-negro contra Coritiba, Palmeiras e Cruzeiro.
O Flamengo do segundo tempo teve, além do atrevimento, da coragem, uma posse de bola mais segura. Talvez pela entrada de Willian Arão no lugar de Cuéllar, dono de um primeiro tempo nada inspirado. O fato é que perdia-se menos bola no ataque e o Corinthians não contragolpeava. Faltava, ainda, a infiltração pelo centro. O Flamengo repetia o número exagerado de cruzmentos como desfecho de qualquer jogada. Dados do Footstats indicam que 41 bolas foram lançadas na área rival. Mas, no clássico deste domingo, cabe um parêntese: penetrar pelo centro da defesa do Corinthians é algo que poucos fizeram neste Brasileiro.
O fato é que o segundo tempo premiou quem buscou o jogo diante de quem especulou. Guerrero já perdera ótima chance em passe de Diego e Juan obrigara Cássio a grande defesa antes de Zé Ricardo colocar Berrío e ganhar agressividade. A mudança, com a saída de Trauco, fez de Éverton o lateral-esquerdo. E funcionou. Éverton Ribeiro, em tese deslocado para o lado esquerdo, juntava-se mais a Diego pelo centro e deixava o corredor para Éverton passar.
O gol de empate, de Réver, veio num escanteio, mais uma bola área, mas o controle de jogo do Flamengo contra um rival tão forte já era mais do que suficiente para justificar o placar. E criou uma mistura de sentimentos na torcida: foi positivo ver o time se impor, mas o resultado até poderia ser melhor num jogo que ainda teve gol quase feito perdido por Diego e bola na trave em desvio contra a própria meta de Pedro Henrique.
Quanto ao líder do campeonato, uma tese se reafirma. Por mais que se confie em sua capacidade de defender, não há jogo totalmente controlado quando a bola circula tão perto da própria área por tanto tempo. O Corinthians já escapara em outros jogos, como contra o Cruzeiro, e continua sem perder. No fim do clássico, Jô ainda teve a chance de vencer o jogo no momento mais improvável. Mas é justo esperar que o melhor time do Brasileiro fique mais tempo longe de sua própria meta.
Quanto ao Flamengo, a formação do segundo tempo pode ter oferecido um caminho,uma alternativa tática que crie soluções para um time cheio de ótimas intenções e comprometido com o protagonismo dos jogos. Mas que precisa ser mais contundente.
Fonte: Carlos Eduardo Mansur
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